“ Sem medo de insistir diante de Deus”!

XXX Domingo do tempo comum

(Jr 30, 7-9; Hb 5, 1-6; Mc 10, 46-52)

Jesus e seus discípulos continuam seu itinerário em direção à Jerusalém. Antes, no entanto, passam por Jericó, distante pouco mais de 27 km da capital Israelita. O destino final, o lugar teológico por excelência será Jerusalém, mas até sua chegada, Jesus não fechará os seus olhos para situações humanas de desespero, angustia, marginalização e exclusão. No coração e na missão do Senhor, a parte, a singularidade o indivíduo é tão importante quanto a totalidade. É uma dialética ainda difícil de compreendermos, um método evangelizador profundamente humanizador, que por vezes, esquecemos de repeti-lo. Em Cristo, uma singela obra de misericórdia como por exemplo, visitar os enfermos, é tão importante quanto, grandes projetos de evangelização.

 

Imediatamente antes da entrada triunfal em Jerusalém e de sua paixão. Marcos narra o episódio desconcertante da cura de um cego em Jericó: “Jesus saiu de Jericó junto com seus discípulos e uma grande multidão. O filho de Bartimeu, cego e mendigo, estava a beira do caminho” (Mc 10, 46). Há um contraste que impressiona nesta passagem: Em primeiro lugar a grande imagem, o triunfo da missão na narrativa de Marcos: Jesus, os discípulos e uma grande multidão. Após seu contrário: Bartimeu, cego, mendigo e sentado a beira do caminho. Bartimeu é um inominado. Sabe-se apenas que é filho de um certo Timeo, certamente de origem grega, portanto já fora do contexto palestino, ainda por cima é um cego, um mendigo e alguém que está ai “a beira do caminho”. Quem seria ele para interromper o destino de Jesus, seus discípulos e as multidões? Ele é apenas um detalhe para os discípulos por exemplo: “Muitos o repreendiam para que se calasse. Mas ele gritava ainda mais: “Filho de Davi, tem piedade de mim” (Mc 10, 48). Há muita gente semelhante a Bartimeu sentada também a beira de nossos caminhos. Há muitos Bartimeus sentados a frente de nossas Igrejas, de nossos clubes sociais, de nossos cinemas, teatros e restaurantes, que foram se tornando invisíveis para nós. Os Bartimeus incomodam muito…gritam com força, tentamos como os discípulos e as multidões impedi-los, pois pensamos que estão atrapalhando o “caminho da Igreja”, mas não estão não. Jesus Nosso Senhor neste final de semana quer nos ensinar que a Evangelização é feita de bons projetos pastorais, pensados, rezados, discutidos, inspirados, mas também é feita de realidades imponderáveis do imprevisto, das surpresas de Deus e de suas oportunidades. Jesus sempre soube aproveitá-las muito bem.

O clamor de Bartimeu fez com que Jesus, parasse e o chamasse: “Eles o chamaram e disseram: coragem, levanta-te, Jesus te chama” (Mc 10, 50). Esta mudança dos planos, este envio despretensioso que Jesus dá a seus discípulos revela um outro ensinamento evangelizador. Para Jesus, nenhuma situação, nenhum sofrimento humano, ninguém que esteja a margem pode ser desprezado ou esquecido do Reino. Se o mundo os despreza, porque eles, os bartimeus de nosso tempo, nada podem oferecer, a misericórdia do Senhor as acolhe.

A segunda leitura nos ajuda a compreender por que Jesus realiza estes gestos tão desconcertantes. A epístola aos Hebreus faz uma leitura cristã do sacerdócio veterotestamentário. Descreve traços que lembram o apogeu da liturgia sacerdotal, a exuberância, os ritos, a beleza do culto de outrora. É como se o desconhecido autor, tivesse uma grande nostalgia dos tempos do culto sacerdotal do AT. Porém não esquece de pontuar alguns traços deste sumo sacerdote, que é Cristo, com nuances misericordiosos, humanos, existenciais e de compaixão: “todo sumo sacerdote é tirado do meio dos homens e instituído em favor dos homens, nas coisas que se referem a Deus, para oferecer dons e sacrifícios pelos pecados. Sabe ter compaixão dos que estão na ignorância e no erro, porque ele mesmo está cercado de fraqueza” (Hb 5, 1-2).

Fora este sentimento, esta compaixão que fez com que Jesus parasse, ouvisse e se compadecesse da dor e do sofrimento de Bartimeu e lhe fizesse a importante pergunta: “ O que quer que eu te faça?” (Mc 10, 51). Na pergunta de Jesus, não pensem estar contida uma tentação constante presente na vida espiritual, de que Deus deve estar disponível a atender todos os nossos pedidos e necessidades, como se Ele é quem tivesse o dever de fazer nossa vontade e não o contrário. Não existe aqui nenhuma subserviência divina em relação ao homem. É presente sim a sua infinita misericórdia. Está manifesta diante das nossas mais secretas e inconscientes necessidades. Na pergunta de Cristo está presente, o “Deus que vê o que está oculto”, até mesmo as realidades mais difíceis de serem vistas por nós mesmos. Muito mais do que um Deus subserviente, Jesus revelou na cura de Bartimeu um Deus rico em misericórdia, pronto a tocar e sanar nossas misérias e pecados.

 

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